A Importância de Conhecer a Comunicação Canina.
Saúde e Bem-estarArticle4 de setembro de 2025
O que é comunicação canina?
A comunicação canina é o conjunto de sinais, comportamentos e sons que os cães utilizam para interagir entre si, com humanos e com o ambiente. Esses sinais incluem expressões faciais, posturas corporais, vocalizações (como ladrar, rosnar ou ganir) além de odores e movimentos da cauda. A linguagem corporal dos cães é muito rica, subtil e cheia de informação importante. O problema... é que por vezes os humanos não sabem reconhecer ou interpretar estes sinais, dando origem a desentendimentos entre espécies!
Por que é importante compreender a linguagem dos cães?
Compreender a comunicação dos cães é essencial para:
Prevenir acidentes e mordidas: A grande maioria das mordidas de cães acontecem porque os sinais de desconforto ou medo foram ignorados ou mal interpretados pelos humanos. Por exemplo, um cão que está a lamber os lábios e a desviar a cabeça para o lado oposto, enquanto uma criança lhe faz festas carinhosamente, está, apesar das boas intenções da criança, a mostrar desconforto. Ignorar esse desconforto pode escalar a comunicação do cão e levar a uma reação mais agressiva.
Fortalecer o vínculo humano-animal: Quando os tutores reconhecem e respeitam os sinais dos seus cães, a relação torna-se mais saudável, baseada na confiança e no respeito mútuo. Esta melhoria da relação facilita o treino, a cumplicidade, aumenta o vínculo e reduz o stress sentido tanto pelo humano, como pelo cão, durante as interações.
Evitar punições desnecessárias: Muitos comportamentos que os humanos julgam como “desobediência” são, na verdade, formas de comunicação. Um cão que se recusa a sentar pode estar com dor nas articulações, medo do ambiente ou simplesmente confuso com o comando. Dentro desta mesma lógica, um cão que rosna não deve ser punido, pois está a expressar o seu desconforto, tentando evitar uma reação mais agressiva. Ensinar que rosnar não é eficaz, pode levar a que o cão, se futuramente se vir numa situação semelhante, opte por comportamentos mais intensos, pois sabe que o rosnar não é eficaz.
Como funciona a comunicação canina?
Os cães comunicam através de comportamentos que são progressivamente menos subtis, à medida que o seu stress, desconforto ou excitação aumentam.

Comportamentos de baixo nível de stress incluem bocejar, lamber os lábios, mostrar o branco dos olhos, olhar para o lado, cheirar o chão, entre muitos outros. Quando estes comportamentos são usados, o cão mostra leves sinais de desconforto ou insegurança. Está num estado racional, em que podemos transformar a situação numa situação positiva.
Por exemplo, um cão que tem pouco contacto com crianças, pode não se sentir seguro ou confortável na sua proximidade, em especial se as crianças estiverem mais excitadas, a correr ou a fazer muito barulho. Nesta situação, se eu observar que o meu cão está a lamber os lábios, a olhar para o lado oposto e a cheirar o chão “distraidamente”, posso optar por vários caminhos:
- ignorar a situação, deixar os acontecimentos acontecerem naturalmente e tanto podemos ter uma situação em que tudo corre bem, como uma situação que gera stress para vários envolvidos, incluído cão e crianças;
- afastar-me um pouco com o meu cão, para uma distância que lhe ofereça mais segurança e reforçar (verbalmente, com festinhas, com comida, com brincadeira... o que o meu cão mais gostar!) a observação calma das crianças, para criar uma associação positiva e reduzir a incerteza em cenários semelhantes no futuro;
- pedir as crianças que se acalmem, que deixem que a interação com o cão seja mais tranquila e ao ritmo do cão, explicando como devem cumprimentar e “perguntar” ao cão se quer ser tocado.
Quando a situação gera mais stress ou incerteza no cão, os sinais corporais começam a ser mais óbvios, e torna-se mais difícil tornar a experiência numa experiência positiva e tranquila para o nosso cão. Aqui, incluem-se sinais como ficar tenso, colocar o peso nas patas da frente, fixar a cauda (seja para cima, ou para o meio das pernas), fixar o olhar, fechar a boca ou colocar as orelhas para trás, junto ao pescoço, entre outros.
Quando o cão exibe este tipo de postura, é importante identificar o gatilho que está a criar tensão e aumentar a distância entre o cão e este estímulo, para que o cão possa relaxar e se torne possível trabalhar a situação de forma a que a experiência seja neutra ou positiva para o cão.
Por fim, em momentos de alto stress ou tensão, o cão mostra comportamentos ainda mais claros, e geralmente reconhecidos pelos humanos como comportamentos agressivos, que incluem rosnar, ladrar e morder. O morder pode ter várias intensidades e intensões, desde um morder o ar, até múltiplas mordidas que podem causar a morte da vítima, pelo que devemos pensar no morder como um espectro de comportamentos e não como uma ação simples.
Aqui, a situação será sempre negativa para todos os envolvidos, e deveríamos ter feito a nossa intervenção antes de chegar a este ponto. De relembrar que os nossos cães podem tomar decisões muito rápidas e o seu temperamento e experiência de vida condicionam a sua resposta às mais variadas situações do seu dia a dia. Assim, para uma situação muito semelhante, podemos ter um cão que desfruta, um cão que tolera e um outro cão que detesta a situação. Cada um deles irá reagir de forma diferente, com sinais corporais diferentes.
Mas então, porque é que o meu cão rosna a brincar?!
Tal como já foi referido, a comunicação canina fica mais óbvia à medida que o stress, desconforto ou excitação aumentam. Isto significa que um cão muito feliz ou muito excitado irá também demonstrar comportamentos mais intensos. Os nossos cães podem rosnar em contexto de brincadeira, ou ladrar de alegria quando chegamos a casa. E claro, insto não deve ser confundido com desconforto e muito menos agressividade!
Por este motivo, não podemos olhar apenas para os sinais que o cão está a dar, mas também ao seu contexto – olhar para o cão e ambiente como um todo. Um cão a ladrar com o corpo tenso, com um abanar de cauda muito rígido, perante um desconhecido, estará em modo “alerta vermelho”, mas um cão a ladrar, com o corpo relaxado, cauda a abanar tanto que parece que dança o samba, porque o seu tutor acabou de chegar a casa, está simplesmente, muito feliz e excitado com este evento. Assim, é sempre importante olhar para o contexto e também para a tensão corporal.
Conclusão
A comunicação canina é uma linguagem própria, rica e cheia de nuances. Conhecê-la deveria ser um objetivo de todos que convivem com cães, seja como tutores, profissionais da área animal ou simplesmente amantes dos animais. Ao aprender a "ouvir com os olhos", abrimos as portas para uma convivência mais segura, empática e harmoniosa com nossos companheiros de quatro patas.
Dra. Teresa Umbelino
Veterinária, especialista em comportamento canino.